“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma de nosso corpo e esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia. E se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre à margem de nós mesmos’. (Fernando Pessoa)

Esta frase de Fernando Pessoa tem um significado especial para as pessoas que estão em fase de pré-aposentadoria. Depois de muitos anos dedicados ao trabalho e às organizações, é preciso fazer uma parada para esquecer os velhos caminhos, velhos hábitos, desaprender o velho para aprender o novo e preparar-se para fazer uma travessia, recomeçando uma nova etapa de vida.

A aposentadoria e o rompimento do trabalho tem um impacto indiscutível na vida das pessoas. É mais do que um simples término de carreira. A interrupção das atividades que ocuparam parte principal da vida, o rompimento dos vínculos sociais, das rotinas diárias e dos hábitos, impõe uma mudança que gera sentimentos ambíguos e antagônicos, pois, ao lado da ideia de liberdade, surge o medo do desconhecido, do novo, de não saber o que fazer e como ocupar seu tempo.

A ansiedade de quem está para se aposentar pode ser resumida em uma pergunta: O que eu tenho medo de perder? Como em muitas outras situações, o medo aqui também impede de enxergar que a aposentadoria pode ser uma das grandes oportunidades na vida, uma travessia, um recomeço.

Para alguns, a aposentadoria surge de forma abrupta e representa uma perda momentânea dos horizontes da vida e de autoestima. Acham que o período mais importante da vida já passou e que já fizeram o que tinham de fazer e consideram a aposentadoria como tempo de parar, descansar, de curtir a tão sonhada ociosidade, que muitos confundem com inatividade.

A verdade é que o mundo do trabalho tem primado por uma visão restrita do trabalhador, vendo-o como um componente do processo produtivo e, não, como um ser humano com sua carga subjetiva e necessidade de realização pessoal. Somos preparados para o mundo do trabalho e não para a vida.
Nossa formação sofreu forte influência da escola formal e empresarial, ambas voltadas para a preparação cultural e profissional, dando pouco valor à formação da pessoa. A ênfase foi no desenvolvimento de competências e habilidades técnicas e quase nada em competências interpessoais. O autoconhecimento foi relegado a um segundo plano. Faltou a educação para a sensibilidade, uma visão ampliada e mais humana da vida. Na verdade, fomos preparados para o mundo do trabalho e não para a vida. E qual a tendência?

A tendência é recolher-se ao seu aposento caseiro munido do kit aposentadoria: pijama, chinelos, cadeira de balanço, jornal, tv com controle remoto, palavras cruzadas, etc. Ou virar um “já que”. Chegam os filhos e dizem “Mãe, já que a mãe está aposentada, não quer cuidar dos netos? Pai, já que o pai está aposentado, não quer ir ao Banco pagar uma conta?”

Alguns conseguem fazer uma transição tranquila para a aposentadoria, outros, no entanto, ficam desorientados, deprimidos, desestruturam-se emocionalmente, sentem-se inúteis e improdutivos. Daí surge um vazio, solidão, baixa autoestima e até a recusa em aceitar a situação, o que pode resultar em uso abusivo do álcool, depressão e outras doenças.

Um dos grandes problemas que percebo, ao trabalhar com o tema, é que, de uma maneira geral, os aposentados param de estudar e ficam limitados às aprendizagens da educação formal e do mundo corporativo, cuja ênfase estava na formação profissional, na preparação para o mundo do trabalho. Ao não investirem no autoconhecimento e em novas aprendizagens, não descobrem novos talentos, até então adormecidos, nem novas ocupações e atividades prazerosas. Na verdade se aposentam do trabalho e da vida.

Assim como você se preparou para o mundo do trabalho, precisa agora se preparar para novos hábitos de vida. É o momento de olhar para trás com orgulho e sentimento do dever cumprido, e também de fazer uma grande ruptura. Para isso é preciso preparar-se, investir no autoconhecimento e no desenvolvimento de competências e habilidades interpessoais, com reforço nas relações familiares, de amizade e na melhoria da qualidade de vida. Pense sobre isso. Muito obrigado!

Que Deus o (a) proteja junto a seus familiares.

Um fraternal abraço e até o próximo artigo.

armelino

Armelino Girardi
Palestrante e consultor em desenvolvimento de pessoas é o criador e mantenedor do portal www.desaposentado.com.br, idealizador e catalisador do Clube dos Desaposentados.

Contato: agirardi@agirardi.com.br

 

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